Pura
sabedoria popular, todos nós já usamos este ditado, quando não, ouvimos
alguém falar alguma vez na vida, principalmente os mais idosos e
aqueles que sempre fizeram questão de primar pela honra, pela retidão e
pelo zelo nos seus negócios.
Na nossa
vida particular, no dia-a-dia, via de regra, somos sempre muito severos
com nós mesmos ou com àqueles que estão sob a nossa responsabilidade,
filhos, netos, irmãos menores de idade.
Fazemos questão de estufar o peito, quando advertimos alguém, e dizer com orgulho: somos pobres, mas honestos!
Isso se
expressa em pequenos gestos do nosso cotidiano, visto termos criado uma
consciência particular com poucas lições, mas rigorosa, intransigente,
de que é feio pegar no que é alheio, de que é errado roubar, de que é
indigno conseguir as coisas, se não for através do trabalho.
Assim,
sempre que ordenamos alguém ir à mercearia, à quitanda comprar um
açúcar, um café ou uma barra de sabão, fazemos a experiência do rigor
de logo perguntar, na volta, quanto custou e quanto restou de troco.
E ai
daquele que ousar faltar no troco, ainda que haja motivo plausível:
hoje recebe uma bronca, uma advertência ou uma recomendação; no passado
seria uma surra pedagógica à vista de todos, ante a existência de uma
clara linha demarcatória entre honesto e ladrão.
No
entanto, o forte rigor na vida privada se enfraquece no espaço público,
quase não existindo, transformando-nos em pessoas flexíveis, para não
dizer condescendentes!
Quase sempre tratamos o espaço público como espaço de ninguém, sem ordem, sem obrigação, sem controle, sem fiscalização.
Muitas
vezes nossa casa, nosso quintal é um brilho, já o lixo acumulado
jogamos no meio da rua ou, quando muito, no terreno baldio do vizinho
ao lado.
Às vezes
danificamos o telefone público, a praça, sujamos a escola, tudo isso
sem nenhum peso na consciência, com a sempre exaltada expressão, quando
alguém ameaça contestar: isso é público!
Essa
mentalidade, esse comportamento de negação do espaço público,
tornando-o espaço de ninguém, colabora fortemente com a ideia que as
elites brasileiras têm do país, justificando a sua apropriação do
Estado e direcionando-o para atender aos seus interesses privados,
através de inúmeros esquemas de corrupção existentes, que acabam por
moldar o funcionamento das instituições brasileiras.
Assim, os
recursos públicos, que deveriam pertencer à coletividade, tornam-se
bens do patrimônio particular de alguns poucos, usados para saciar
deleites e esbanjar, com a compra de carros de luxo, apartamentos,
fazendas, para pagar universidades dos filhos no exterior ou ainda na
compra de uísques caros, debitados quase sempre na conta da alimentação
escolar, e outra parte serve como garantia das apostas nas noitadas em
mesas de jogo de azar, costume público de muitos representantes do povo
do Maranhão.
Por seu
turno, as autoridades, que têm a justificativa da sua constituição nas
leis, que fazem o juramento de defendê-las, ao ocuparem os espaços
públicos, sentem-se acima de tudo e de todos.
A lei e o
povo tornam-se meros detalhes a serem driblados, enganados,
ludibriados, passados para trás e quase sempre, solenemente, pisados e
ultrajados.
Diante
desse quadro de ilegalidades e ilicitudes, o resultado desse emaranhado
de fatores não poderia ser outro: miséria e pobreza na vida diária dos
brasileiros, em particular dos maranhenses.
Afeta,
sobretudo, o conjunto de direitos que garantem a dignidade da pessoa
humana, entre estes: direito à educação de qualidade, à saúde, ao
lazer, a alimentação escolar, à previdência social, ao saneamento
básico, à moradia, à segurança, ao trabalho.
Ou seja, direitos elementares que toda pessoa tem e deve usufruir para se sentir humano.
Claro está
que tais comportamentos, ao inviabilizar a existência do espaço e dos
recursos públicos, comprometem a consolidação da democracia, a
efetivação das políticas públicas, o respeito aos direitos humanos e a
promoção da dignidade da pessoa humana.
À bem da
verdade, a negação sistemática desses direitos e a sua violação
cotidiana, quando devidamente investigados, quase sempre nos faz
deparar com o desvio, a malversação, a apropriação indevida dos
recursos públicos, encontrando essas práticas na corrupção a sua
síntese.
A
corrupção tem a façanha de mascarar a realidade nua e crua vivida por
milhares de pessoas neste país quando, diante de uma situação de
violação de direito, faz-nos sentir impotentes e chegamos a acreditar
que o abandono é sina que temos que cumprir.
Não
percebemos que toda essa realidade é orquestrada e levada a cabo por um
grupo muito bem estruturado, que se organiza em quadrilha, cujo
objetivo é roubar o dinheiro público, pois encontra na corrupção um
meio fácil, uma escada, para enriquecer, mudar de status e adquirir
prestígio social.
Se este
texto fosse lido por jurista estrangeiro ou enviado a qualquer pessoa
que nunca tenha vindo ao Brasil, muito menos ao Maranhão, mas que
tivesse a par do nosso sistema legal, Constituição, leis e tratados
internacionais de combate à corrupção, certamente me classificaria como
louco, revoltado sem causa ou coisa parecida.
Isso quer
dizer que o problema aqui não é a ausência de lei ou sua insuficiência,
mas a efetividade destas, por culpa única e exclusiva da inércia dos
órgãos do Estado responsáveis pela execução das mesmas.
Observamos
que muitas vezes esses órgãos, quando atuam, resolvem agir beneficiando
os corruptos, contra a lei, em nome de um direito individual qualquer,
em prejuízo total da coletividade, criando um sentimento de impunidade,
o que, de certa forma, contribui para o aumento da corrupção.
Como contra-corrente a
essa avalanche de ilegalidades, a sociedade civil encontra na
organização social e nas mobilizações de massa a forma de forjar nova
consciência de cidadania.
Exemplo de
tal postura têm sido as ações empreendidas pelos Fóruns e Redes de
Cidadania encontrados em todas as regiões do Estado Maranhão, que tem
no combate implacável à corrupção uma das vias de mudança na vida da
república brasileira.
Com ações
massivas, como a mobilização em torno da cobrança da prestação de
contas, que só este ano articulou em média 60 (sessenta) municípios
maranhenses, este movimento conseguiu tornar esse ato uma bandeira de
luta social, um exercício concreto de cidadania, uma forma de pensar as
políticas públicas e uma maneira de combater de forma eficaz a
corrupção.
Algo de curioso, para não dizer falta de escrúpulos, ocorreu neste caso.
Apesar dos
prefeitos e presidentes de câmara de vereadores terem entregues suas
contas ao Tribunal de Contas do Estado, em abril de 2011, comemorado
por este órgão como recorde, o mesmo não se pode dizer da
disponibilização das referidas contas para a população, como também
determina a lei.
Insignificante o número dos que cumpriram a lei, muito embora prefeitos e presidentes de Câmaras tenham assinado no órgão de contas, na ocasião da entrega, declaração formal afirmando a disponibilidade das contas, numa nítida demonstração de que não têm receio de cometer qualquer crime, pois dificilmente serão punidos.
Insignificante o número dos que cumpriram a lei, muito embora prefeitos e presidentes de Câmaras tenham assinado no órgão de contas, na ocasião da entrega, declaração formal afirmando a disponibilidade das contas, numa nítida demonstração de que não têm receio de cometer qualquer crime, pois dificilmente serão punidos.
Nas
fiscalizações feitas observou-se que às vezes a nota fiscal existe,
está perfeita, tudo certo, mas na realidade o dinheiro dos medicamentos
foi para a compra de um carro importado, adquiriu um apartamento de
luxo, pagou caixas de uísque 12 anos.
Diante
desse fato, uma pergunta se impõe: de que adianta, então, o Tribunal de
Contas fazer a análise da prestação de contas, se os principais
interessados, que vivem no lugar, não terão oportunidade de verificar a
ocorrência na realidade?
Não passará de mero exercício burocrático, trabalho de faz de conta, obra de ficção!
Certamente
os corruptos não levariam a vida mansa que levam, expondo publicamente
o fruto do roubo, se não contassem com a omissão, a conivência, a
cumplicidade, a benevolência e a participação, quem sabe, dos próprios
integrantes do Estado.
No
entendimento do famoso bandido Al Capone, que colocou em xeque as
instituições norte-americanas e só foi preso e punido devido à criação
de força tarefa e leis especiais, o crime compensa, até quando todos puderem ser comprados!
Grande
tarefa, então, terá a sociedade civil e os movimentos sociais, a fim de
tomar as rédeas da república, no exercício do poder de fiscalização, na
denúncia das autoridades envolvidas em atos de corrupção ou omissão das
suas funções, no controle e no direcionamento dos recursos públicos
para a promoção da dignidade de todos os brasileiros.
Se não for
esse o caminho, estaremos fadados ao fracasso enquanto pátria de todos
e mãe gentil, sabendo de antemão que única certeza será a chegada da
morte, esta, como disse Drummond, vem a cavalo de galope, sem avisar, sem dar tempo de escondê-los vai levando meus amores.
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